terça-feira, 16 de agosto de 2011

PRONATEC: UM DIÁLOGO SOBRE SER OU NÃO SER CAPAZ DE INCLUIR


Vania Medeiros *


Quero ser capaz de discutir assuntos polêmicos sem colocar o outro em uma posição inferior só porque não alcança minhas idéias. E principalmente sem me colocar também numa condição de inferioridade pelo que sou capaz de enxergar do lugar em que estou. Entendo que sendo honesta, aberta e tolerante, posso enxergar além da minha visão limitada, através do olhar dos outros. Isto é o que mais quero aprender a praticar neste momento de minha vida de educadora. E, se me permitirem, também ensinar.

Quero apostar na cordialidade e no respeito que deve permear as ações políticas, administrativas e pedagógicas, e me posicionar de forma mais clara acerca da greve e especificamente sobre a pauta que envolve a discussão sobre o PRONATEC. Aliás, essa não é uma tarefa fácil, e me parece que é a grande dificuldade de boa parte daqueles que não vão às assembléias ou, se vão, ficam em silêncio com medo de serem ridicularizados pelos seus posicionamentos, coisa que alguns são hábeis em fazer...

Com relação à greve, acho que é bem vinda, não apenas pelo que ela traz como reivindicações mas, principalmente, pelo que ela está sendo capaz de fazer em termos de mobilização e discussão. Há muito precisávamos de um momento como este.

A respeito do PRONATEC, não desejo fazer uma análise do ponto de vista histórico ou sociológico da educação profissional, mas posso me atrever a dizer o que penso. Primeiro, incomoda-me fortemente as críticas ao PRONATEC de forma generalizada realizadas através do método dialético. A tese (imposta pela greve) é que o PRONATEC agride o ensino profissional e tecnológico, em seus princípios de qualidade, integralidade e gratuidade. A antítese (para os mais conservadores) é que vem ser o resgate do ensino profissional e tecnológico. Deste embate surge a síntese, que se compõe de elementos do confronto, mas que finaliza o assunto a partir das idéias daqueles que exercem melhor a arte da construção dos argumentos  gerando, assim, uma nova tese (O PRONATEC é uma ameaça ou o PRONATEC é a salvação).  Este processo nos leva a um risco: a pauta da greve se transforma em um palco de posicionamentos científicos ou um rancking de luta onde se apresenta as posições e argumentos.

Então, dito isto deveria eu propor uma nova forma de discussão do PRONATEC, infelizmente, não vejo espaço para esta ação... Mas quero tentar contribuir com a transformação de práticas políticas, para além da Dialética Marxista. Afinal, se sou educadora tenho que confiar nas mudanças, e lutar por elas significa não assumir posturas intuitivas, mas adotar uma ótica epistemológica, como recomenda Paulo Freire. Quero, também, avançar para uma postura dialógica, como sugere Edgar Morin, quando diz que a dialógica sugere a dualidade, não ser contra ou a favor, mas ser as duas coisas simultaneamente.

Sou a favor dos objetivos do PRONATEC, tais como expandir, interiorizar e democratizar o ensino profissional e tecnológico; fomentar a rede de formação profissional e ampliar as oportunidades educacionais dos trabalhadores.

Sou a favor do que está posto no PL do PRONATEC sobre a União repassar recursos para a rede pública de educação profissional federal, estadual e municipal, e para o sistema nacional de aprendizagem com dispensa de convênios, contratos ou instrumento congêneres, mas obrigando a prestação de contas. Em vista disso,  não aceito generalizações de que o PRONATEC está condicionado ao repasse de recursos para instituições particulares. Este é só mais um item, que podemos revisar em nossas negociações, não para impedir este repasse, mas exigir acompanhamento e responsabilidade.

Sou a favor da Bolsa-Formação Estudante e a Bolsa-Formação Trabalhador.
  
Sou a favor do pagamento de bolsas a servidores (técnicos e professores) que estiverem atuando no âmbito do PRONATEC. Como também não sou contra o pagamento a aposentados que tiverem envolvidos no PRONATEC. Trata-se de valorização do potencial de trabalho de muitos que estão marginalizados nas instituições de ensino profissional e tecnológico. Particularmente os técnicos poderiam atuar como formadores (educadores) dentro de suas experiências profissionais e os aposentados poderiam se sentir parte das instituições que ajudaram a construir.

Mas, não pretendo ver estes pontos como os mais fortes do PRONATEC. Para mim, o que há de melhor é o projeto pedagógico que está por traz disso com o fortalecimento da extensão no contexto da formação profissional e tecnológica. Uma extensão que vai além daquele conceito de prestação de serviço ao setor produtivo. Do lugar em que estou entendo o seguinte:

·         Para os novos campi – uma oportunidade de começar com cursos FIC (livremente, sem manual a seguir, mas com carga horária mínima de 160 horas e acompanhamento pedagógico, articulados a partir de demandas sociais. E não me refiro aqui ao mercado de trabalho, mas ao mundo do trabalho, que hoje envolve criatividade e organização comunitária, na perspectiva de uma economia solidária, que, aliás, nem estamos estudando como deveríamos. Cursos gratuitos para a comunidade, sem concursos.


Depois de experimentados e avaliados por critérios científicos, os cursos FIC poderão dirigir a consolidação de novas áreas de ensino dentro dos Institutos (inclusive nas áreas sociais, de humanas e saúde) com a organização de cursos técnicos integrados, que poderão estar de acordo com o Catálogo Nacional ou serem novos cursos propostos pelas instituições de ensino. Um laboratório educacional em plena atividade onde de fato se inicia com extensão e se amplia para a pesquisa e o ensino. Isto será possível se a Rede tiver bem dirigida com a possibilidade de construção de novas identidades construídas a partir de uma verticalização bem planejada. O PRONATEC, embora se refira a cursos nas modalidades FIC e técnico de nível médio, não impossibilita que aconteça nos campi o ensino superior e de pós-graduação, que uma vez implantados poderiam estar associados às atividades PRONATEC, como espaço de construção da indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensão.

·         Para os campi já instalados – uma oportunidade de revisar suas práticas e, de uma vez por todas, assumir a indissociabilidade acima referida. A resistência aos cursos na modalidade FIC implica na resistência à extensão, na resistência à interação com a comunidade. Ainda pensamos que somos portadores de uma educação de qualidade, que exige tempo e espaço formal. Esta é uma idéia pedagógica pautada em uma educação bancária e em uma epistemologia racionalista. Não seremos capazes de ensinar Cidadania, Ética, Consciência Política e Ambiental em contato com os interesses da comunidade? Somos incapazes de manter essa interação construindo este conhecimento em uma Pedagogia Relacional ao mesmo tempo em que se tenta construir dignidade para todos? Parece que ainda estamos defendendo modelos disciplinares, onde o professor de Sociologia, Política e Filosofia é quem pode em um espaço específico ensinar tudo isso? Será que o que nos falta não é a prática transdisciplinar dentro dos contextos sociais? O nosso desafio é integrar de fato formação geral à formação profissional na construção de dignidade respeitando as especificidades sem sermos específicos. Há muita pesquisa para fazer nos cursos FIC com resultados rápidos e que podem dirigir as políticas de educação profissional. Digo, rápido porque os problemas sociais, particularmente, envolvendo a juventude, só se agravam e nossos modelos estão ultrapassados e são lentos. Eles deveriam deixar de ser crenças e dogmas e passarem a ser flexíveis e abertos. Vejo no PRONATEC uma grande oportunidade.
     
Para ser coerente com o que quero aprender a fazer também admito:

Sou contra o PRONATEC no que diz respeito à falta de clareza do PL 1209/2011 sobre como vai funcionar o repasse deste recurso. O PL define bolsa-formação estudante como sendo o custo total do curso por estudante e regulamenta que esta bolsa será dirigida a estudantes de ensino público médio propedêutico para que ele possa fazer curso profissionalizante na modalidade concomitante. Quem não oferecer esta modalidade não terá a bolsa garantida para os estudantes? O recurso vai para as instituições promotoras ou para o estudante? O que significa uma contratação individual do estudante? Qual o Fundo que garantirá estas bolsas? Diz o PL que o Fundo de Ensino Superior passa a ser denominado Fundo de Financiamento Estudantil e este Fundo poderá financiar alunos em cursos de educação profissional e tecnológica, bem como em mestrado e doutorado, desde que haja disponibilidade de recursos. Afinal no PRONATEC teremos um Fundo Especial para estas bolsas ou vai ser a sobra do Fundo de Financiamento Estudantil que hoje financia cursos superiores?

Sou contra a falta de esclarecimentos sobre como os programas de Transferência de Renda vão se atrelar ao PRONATEC. O que significa neste caso contrato empresarial para atendimento à formação do trabalhador, se a referida bolsa é para trabalhadores vinculados aos Programas de Transferência de Renda?

Sou contra, no PRONATEC, à falta de uma discussão aprofundada sobre a diferença entre fomento de cursos profissionais e tecnológicos e a bolsa-formação.

A minha esperança é que dialoguemos ao invés de fazermos exposições vagas sobre quem pode e quem não pode acompanhar essas discussões. Afinal, é dever de todo educador ser agente de transformação social.


* Professora do IFPB

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